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Atualizado em 07.09.2018
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Maria Antônia Moura de Castro

N. 13 de Junho de 1910
F. 2 de Dezembro de 1946
Por Gustavo Pires de Andrade Neto

Maria Antônia Moura de Castro Massé nasceu no Rio de Janeiro em 13 de junho de 1910. Foi uma pianista brasileira radicada em Paris. Era filha de Maria da Glória Moura de Castro e do cineasta e empresário da indústria cinematográfica Vital Ramos de Castro, proprietário de quase vinte cinemas no Rio de Janeiro, entre eles o Cine Plaza. Foi casada com o arquiteto francês Alfred Nestor Georges Massé e mãe de Louis François Bernard Massé. Era sobrinha do Coronel José Pires de Andrade e nora do advogado e jornalista Alfred Massé, ex-Ministro do Comércio da França.

Maria Antônia de Castro iniciou sua carreira ainda criança, realizando concertos em diversos países. Começou a tocar aos três anos de idade[1]. Em 1916, realizou seu concerto de estreia, ao ar livre, na Quinta da Boa Vista no Rio de janeiro, com apenas seis anos de idade. Por ocasião da presença do compositor Darius Milhaud no Brasil os dois tocaram juntos uma sonata de Mozart no concerto Hora Artística, do Lycée Français[2]. Maria Antônia apresentou concertos pouco depois em Buenos Aires e em Montevidéu. Em 1920, aos nove anos, apresentou-se no Aeolian Hall em Nova York, executando peças de Villa-Lobos. Ainda na turnê pelos Estados Unidos, apresentou-se em Washington[3]. Em 1920, deu um recital na Salle Gaveau em Paris. Em 1921, tocou no Palácio do Catete diante do Presidente da República Epitácio Pessoa. Tocou também no Palácio da Guanabara, em audição particular para o Rei Alberto I da Bélgica. Em abril de 1921, com apenas dez anos de idade, apresentou um concerto na Salle Érard acompanhada pela orquestra da Sociéte des Concerts du Conservatoire[4]. Na mesma sala, apresentou em junho do mesmo ano a peça Wedding Cake, de Saint-Saëns[5]. Em julho de 1923, tocaria de novo paa Epitácio Pessoa, mas desta vez na recepção em sua homenagem oferecida pelo Comité France-Amérique nos seus salões no Champs-Elysées em Paris[6]. 

O talento precoce da pianista atraiu a atenção de jornais estrangeiros, entre eles o New York Times, referindo-se a ela como "um prodígio musical que na idade de nove anos executa Bach, Handel, Beethoven e Chopin, tendo, de passagem para a Europa, realizado com grande êxito recitais nesta cidade"[7].

Ao longo de sua carreira adulta, destacou-se como intérprete de Villa-Lobos e de outros compositores brasileiros. Realizou turnês por diversos países, especialmente no Brasil e na França, países onde morou, mas também se apresentando em cidades como Roma, Viena, Berlim, Luxemburgo, Bruxelas e Londres.

Maria Antônia de Castro residiu em Paris durante a maior parte do tempo entre os anos 1920 e 1946, regressando ao Brasil repetidas vezes, muitas das quais apresentou recitais no Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Em entrevista ao Correio da Manhã, expressou: "Parto sempre para a Europa com o desejo de voltar ao meu Brasil. Infelizmente, raro consigo realizar esse desejo, presa a compromissos que não devo fugir. Nós somos escravas da nossa arte e esta exige ambientes mais amplos que os da própria pátria, se é que desejamos conquistar um nome e a consagração definitiva"[8].

Antes de se mudar para a França, Maria Antônia tinha tido classes de piano no Brasil com o compositor Henrique Oswald. Para incentivar o desenvolvimento do talento da filha prodígio, o cineasta Vital Ramos de Castro decidiu transferir-se com toda sua família para Paris em 1920 para que a filha pudesse ali seguir seus estudos musicais[9]. Vital Ramos de Castro adquiriu uma grande casa nas imediações do Parc Monceau onde residiu com sua esposa e seus cinco filhos. Sua casa seria um importante ponto de encontro e de saraus musicais para artistas brasileiros radicados em Paris, como o compositor Heitor Villa-Lobos, que trabalharia na sonorização de um de seus filmes, o maestro Souza Lima e a pintora Tarsila do Amaral[10], amiga de Maria Antônia[11]. O círculo de amizades da família Castro em Paris incluía ainda, por exemplo, o embaixador Luís Martins de Souza Dantas e o maestro português Luís de Freitas Branco. O crítico de arte Sérgio Milliet destacava, em 1923, a pianista Maria Antônia como representante da "embaixada intelectual" do Brasil na Europa, ao lado de figuras como Tarsila, Brecheret, Malfatti, Souza Lima e Villa-Lobos. Milliet considerava que o triunfo de Maria Antônia em Paris era a consagração de sua genialidade artística[12].

Recém chegada a Paris em 1920[13], Maria Antônia foi convidada[14] a estudar no Conservatório de Paris, onde foi discípula do professor Isidor Philipp, amigo de Massenet e de Saint-Saens. Em 1921, tomou parte em outro concerto em Paris organizado por Barrozo Netto, junto a outros pianistas brasileiros. Em 1923, Maria Antonia destacou-se na audição final do curso do Conservatório, realizada na Salle Érard, recebendo o Primeiro Prêmio[15] com apenas treze anos de idade[16]. Na mesma Salle Erard apresentou-se posteriormente com Bidu Sayão. Também participaria ao lado de Bidu Sayão, entre outros artistas, de um concerto no Teatre Femina, em homenagem ao presidente Washington Luís. Do evento, promovido pelo embaixador Souza Dantas, também participaram outros artistas brasileiros: a cantora Vera Janacópulos, a violinista Carmen Castelo Branco, o tenor Camargo e o maestro Souza Lima[17]. Em 1926, Maria Antonia de Castro executa em Paris o Andante e Variações de Henrique Oswald para piano e orquestra no Teatro Châtelet[18], acompanhada pela Orquestra Colonne, sob regência do compositor francês Gabriel Pierné[19]. Em 1927, foi convidada a participar das celebrações do centenário de Beethoven em Viena. Em 1929, apresentou-se no Tivoli de Lisboa, esgotando a capacidade do teatro, acompanhada pela orquestra do Maestro Freitas Branco. No mesmo ano, participa na Sorbonne diante de um público de cinco mil pessoas de um concerto oficial organizado pelo governo francês, sendo a única artista estrangeira convidada[20]. Em 1937, participa dos Saraus de Gala da Delegação Brasileira à Exposição Universal de Paris[21]. Neste mesmo ano, grava para a Pathé músicas de Villa-Lobos e de Pierné[22]. Em 1938, é louvada pela crítica parisiense por seus notáveis concertos na Societé des Concerts du Conservatoire e nos Concerts Colonne[23]. Em 14 de junho de 1939, oferece um "recital ao microfone" na BBC de Londres, apresentando obras de Villa-Lobos, Barrozo Netto, Henrique Oswald, Frutuoso Vianna, Debussy, Ravel e Phillipp[24]. No mesmo ano grava em Nova York para a Columbia Records composições de Villa-Lobos, destacando-se o Choros Nº 5 "Alma Brasileira"[25].

Após casar-se com Georges Massé nos anos 1930, Maria Antonia e seu marido instalaram-se na residência do pai da noiva em Paris, próxima ao Parc Monceau. O hôtel particulier, construído em 1879 pelo arquiteto Léopold Cochet, havia sido escolhido por Vital de Castro em homenagem à filha por ter a fachada decorada com alegorias musicais. Maria Antônia visitava regularmente o Rio de Janeiro e fixou-se temporariamente no Brasil em 1940 devido à ocupação nazista na França. Seu retorno ao Brasil foi noticiado na capa do jornal carioca Correio da Manhã. Maria Antônia, no entanto, retornaria a Paris poucos meses depois, para acompanhar seu marido que seguia na França: "Não posso dar concertos por escrúpulo muito íntimo, filho de minha sensibilidade, em virtude de meu marido encontrar-se na frente de batalha"[26].

Em 1943, apresentou peças de Strauss no Teatro Municipal do Rio de Janeiro[27]. Em 1944, apresentou-se em São Paulo, na Sociedade de Cultura Artística, sua última apresentação no Brasil[28]. A pianista faleceu de tuberculose em Leysin na Suíça em 2 de dezembro 1946 com apenas trinta e cinco anos de idade. Foi divulgado nos jornais da época que o avião que trasladava o corpo da pianista para o seu enterro no Brasil sofreu um acidente em Portugal. A pianista está enterrada no jazigo familiar no Cemitério de São João Batista no Rio de Janeiro.

A lista de cidades em que se apresentou como pianista inclui as seguintes no Brasil e no exterior: Rio de Janeiro, São Paulo, Recife e Belém; Paris, Londres, Lisboa, Bruxelas, Antuérpia, Liège, Luxemburgo, Nice, Cannes, Fontainebleau; e ainda Nova York, Washington, Buenos Aires e Montevideo.

Apresentou concertos sob direção dos grandes maestros do seu tempo, como Gabriel Pierné, Philippe Gaubert, René Baton, Tracol, Casadesus, Eugene Biot, Francisco Braga, Pedro de Freitas Branco, Eloor Arpers e Alexander Sienklevicz.

Como solista, apresentou-se acompanhada por orquestras tais como Colonne, Lamoureux, Pasdeloup, Orquestra do Conservatoire e Orquestra de Paris, entre outras[29].

No foyer do Instituto Nacional de Música (edifício histórico da atual Escola de Música da UFRJ) no Rio de Janeiro foi instalado um retrato, pintado em 1921 por Madame Valmalete em Paris, em homenagem à pianista Maria Antonia de Castro[30] (Madeleine, filha de Madame Valmalete, também era pianista e amiga de Maria Antonia. Marcel, seu filho, foi empresário de Maria Antonia). O retrato foi amplamente elogiado pela imprensa francesa durante sua exibição na Exposição Bernhein de 1921 realizada em Paris[31].

O compositor Barrozo Neto dedicou algumas de suas obras à pianista Maria Antônia de Castro: Danse des Fantoches, Feux Follets[32] e La Ronde qui passe[33].

[1] «Como nos vêem em França». Revista da semana. 18 de agosto de 1928, p. 35.

[2] LAGO, Manoel Aranha Corrêa do (2005, pp. 198-199) (Lago cita o Programa do Concerto existente no Arquivo de Paul Guerra)). O círculo Veloso-Guerra e Darius Milhaud no Brasil. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. pp. 198–199.

[3] «Notas e Notícias - Maria Antonia». Correio da Manhã. 4 de fevereiro de 1920.

[4] BERTHOLET, Edouard (1994). La reincarnazione nel mondo moderno. Roma: Edizioni Mediterranee.

[5] RATNER, Sabina Teller (2002, p. 259). Camille Saint-Saëns, 1835-1921: A Thematic Catalogue of His Complete Works. Oxford: Oxford University Press.

[6] «Amérique Latine En l'honneur de M. Epitacio Pessoa ancien Président du Brésil». Le Figaro. 9 de julho de 1923.

[7] «Maria Antonia a caminho de França. A pequena pianista brasileira e a imprensa dos Estados Unidos». Correio da Manhã. 9 de fevereiro de 1920.

[8] «As grandes pianistas brasileiras». Correio da Manhã. 17 de outubro de 1926, p. 3.

[9] «Notas e Notícias - Maria Antonia». Correio da Manhã. 4 de fevereiro de 1920.

[10] SOUZA LIMA, João de. Moto Perpétuo: a visão poética da vida através da música - Autobiografia do Maestro Souza Lima. 1982: Ibarra. pp. 110–111.

[11] GRIECO, Donatello (2009, p. 60). Roteiro de Villa-Lobos. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão.

[12] MILLIET, Sérgio. «Cartas de Paris.». Ariel. Nº6, Março de 1924.

[13] «Notas e Notícias - Maria Antonia». Correio da Manhã. 4 de fevereiro de 1920.

[14] «BRAZILIAN WONDER MUSICAL CHILD TO VISIT STATES SOON». The Daily Capital Journal. Salem. 13 de novembro de 1919.

[15] «A cidade ganhou suntuoso cinema». A Noite. 29 de setembro de 1940, p.5.

[16] «Monumento Musical - Maria Antônia». Ilustração Brasileira. Ano 4, Nº33, Maio de 1923.

[17] SOUZA LIMA (1982, p. 102). Moto perpétuo: a visão poética da vida através da música: autobiografia do maestro Souza Lima. São Paulo: Ibrasa.

[18] «A pianista Maria Antonia em Paris». Correio da Manhã. 23 de março de 1926, p. 2.

[19] MARTINS, José Eduardo. Henrique Oswald: músico de uma saga romântica. [S.l.: s.n.].

[20] «A pianista Maria Antônia e os seus successos em Portugal e França». Correio da Manhã. 23 de abril de 1929, p. 5.

[21] «Radiophonices». Diario de Notícias. 1 de junho de 1939, p. 8.

[22] «Research Centre for the History and Analysis of Recorded Music» (Disponível em: http://www.charm.rhul.ac.uk/discography/search/search_advanced?operatorSel_0=and&parameterSel_0=performer&parameterKey_0=artist_029245&parameterKeyTxt_0=Maria%20Antonia%20de%20Castro,%20piano).

[23] «Radiophonices». Diario de Notícias. 1 de junho de 1939, p. 8.

[24] Op cit.

[25] Verbete “Choros nº 5” na Wikipedia. (Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/Ch%C3%B4ros_No._5).

[26] «Regressou hontem ao Rio a pianista brasileira Maria Antônia Massé». Correio da Manhã. 5 de maio de 1940.

[27] «Arte, Elegância e Caridade». Correio da Manhã. 25 de setembro de 1943, p. 1.

[28] OLIVEIRA, Clóvis. «Crônica Musical de São Paulo». Resenha Musical (São Paulo), nº 65-76, 1944.

[29] «Faleceu na Suíça a consagrada pianista brasileira Maria Antonia». Jornal de Notícias. São Paulo. Edição 194. (1946).

[30] ALENCAR PINTO, Aloysio (8 de julho de 1999). «Série Trajetórias». (Disponível em: http://abmusica.org.br/downloads/Aloysio%20de%20Alencar%20Pinto.pdf)

[31] «A jovem pianista Maria Antonia - O retrato da talentosa artista brasileira na exposição "Bernhein" - elogios da imprensa parisiense». Jornal Correio Paulistano. Edição 20976. (1921).

[32] BARROZO NETO, Joaquim Antonio. Feux Follets (partitura). (Disponível em: https://painelsesc.sesc.com.br/Partituras.nsf/viewLookupPartituras/FCAF1003A9026F4F83257C0F00662E53/$FILE/BarrozoN_Feuxfollets.pdf).

[33] SANTOS, Helen Rodrigues (2006). JOAQUIM ANTONIO BARROZO NETTO: ANÁLISE DAS SUÍTES INFANTIS PARA PIANO A QUATRO MÃOS. Rio de Janeiro: Universidade do Rio de Janeiro. pp. 217–218.